Em meio à convulsão social e política, vinte atores incorporam o espírito da crise. Nesta adaptação contemporânea do clássico mundial "Os Demônios", romance político-filosófico do escritor Fiódor Dostoiévski, a polifonia frenética dos jovens revolucionários de uma cidade russa do século XIX se choca, explode e encontra ressonância nos impasses e possibilidades existenciais do mundo atual. Dirigido por Daniel Guerra e adaptado por Bárbara Pessoa o espetáculo volta a cartaz no dia 15 de agosto, no Teatro Vila Velha e fica em temporada até 08 de setembro, as sextas, sábados e domingos. As Sextas e sábodos às 20 horas e domingos 19 horas. A primeira montagem do espetáculo foi em novembro de 2018, com presença massiva do público soteropolitano. Agora, em agosto de 2019, estreará o mesmo espetáculo com uma nova roupagem. No palco, os atores incorporam a polifonia tresloucada de vozes e corpos daqueles jovens russos que inspiraram Dostoiévski na sua crítica cruel à sociedade e à proporção trágica que as divergências políticas podem tomar. Revela-se, portanto, uma vigorosa via experimental enquanto processo, que acata as mudanças radicais da época e a própria transformação da ideia original através do tempo. Daniel Guerra traz aos palcos uma outra visão, tendo como base a primeira versão. Agora o espetáculo se apresenta mais cru, mais selvagem, de onde o teor filosófico e existencial do texto sobressai, sem perder o ritmo frenético dos demônios dostoievskianos. Quem viu a primeira temporada se surpreenderá com as mudanças possíveis de ponto de vista a partir de um mesmo tema, e quem ainda não viu, terá a chance de presenciar uma montagem vigorosa de um clássico da literatura, proposta por uma equipe soteropolitana que traz toda a carga de experimentação que o teatro contemporâneo pode proporcionar.
Dostoiévski e “Os Demônios”
Dostoiévski escreveu “Os Demônios” inspirado num fato verídico, o assassinato de I. I. Ivanov, um estudante revolucionário, executado pelos seus próprios companheiros de grupo, e a liderança de tal ato por S. G. Nietcháiev, um jovem niilista. A partir daí Dostoiévski ficcionaliza os fatos, e ao fazê-lo, reelabora com maestria as questões políticas e existenciais, filosóficas e sociais. O humano é escancarado pela pena cruel do escritor russo, que, longe de tomar partido de um lado ou de outro no complexo mundo político da época, escolhe ver a coisa de dentro, e sentido ele mesmo tais dores convulsivas, faz-nos vivenciar e criticar a turbulência do plano geral. No universo dostoievskiano não há uma moral última, não há lados a escolher, as definições morais e éticas surgem apenas das bocas dos personagens, e portanto, são sempre relativizadas por seus atos. Num país e numa época onde a cada passo se pede que nos definamos de um lado ou de outro, um golpe a uma só vez corrosivo e poético na sociedade como um todo pode revelar sempre uma beleza inusitada, como o faz Dostoiévski. Ao fim, é sempre a inteligência que será conclamada ao centro do jogo.
Temas centrais
Nesta adaptação encontram-se os temas existenciais que despontam durante qualquer crise sócio-política: a relativização ética quanto ao valor da vida humana, como por exemplo a ideia de assassinato justificada por causas políticas, o suicídio como fuga ou redenção em meio a uma sociedade cruel. Há também um olhar preciso sobre como uma liderança política pode passar da influência à manipulação, e em como a energia erótica presente em qualquer confluência coletiva em torno de uma figura autoritária pode se transformar na mais cruel violência. A emergência do autoritarismo, até entre indivíduos que apostam em valores libertários, é exposta de maneira precisa. A adaptação aborda ainda o conflito geracional que caracteriza a história da sociedade moderna ocidental, e suas consequências políticas no nível macro e micro estrutural. Esses e muitos outros temas são marcantes na escrita de Dostoiévski, trazidos à tona agora por uma equipe de mais de vinte profissionais baianos, num Brasil atordoado pelos rumos políticos atuais.
Serviço
O quê: Os Demônios — Outra Versão
Onde: Teatro Vila Velha
Quando: 15 de agosto a 08 de setembro. De sexta a domingo, com uma única quinta-feira de estreia, dia 15 de agosto. Quinta, Sextas e sábados 20h, Domingos 19h.
Quanto: R$30 inteira/ R$15 meia
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