Apesar da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) ter aprovado o reajuste de 15,5% nos planos de saúde individuais e familiares em maio e dos recorrentes aumentos das mensalidades dos planos coletivos, que não dependem de autorização da ANS - o reajuste médio dessa modalidade em 2021 foi de 5,55% para os contratos com pelo menos 30 vidas e de 9,84% para aqueles com até 29 vidas - muitos usuários têm sofrido com práticas limitantes ou abusivas dos planos. Diante da não cobertura de procedimentos essenciais, reajustes abusivos e negativas diversas dos planos, consumidores têm recorrido à justiça para fazer valer o seu direito. Entre 2015 e 2021, cerca de 400 mil novos processos ligados à temática da saúde foram registrados por ano no Brasil. Desses, 130 mil são contra planos e seguros de saúde. As soluções jurídicas variam conforme as diferentes ações que podem ser movidas.
Entre as demandas mais frequentes, destacam-se os pedidos de cobertura de procedimentos (inclusive estéticos reparadores), de materiais essenciais ao ato cirúrgico e de honorários médicos (inclusive de anestesia); e realização de exames e procedimentos que exigem o uso de novas tecnologias (ainda que não estejam previstos no rol da ANS). Além disso, a cobertura de fisioterapias, psicoterapias, fonoterapias, terapia ocupacional e demais terapias necessárias aos tratamentos contínuos, sem restrição de atendimento, tem sido foco de um bom número de processos judiciais. A dificuldade para obter tanto a cobertura de tratamento domiciliar (Home Care) quanto o ressarcimento ou reembolso das despesas médico-hospitalares são outras reclamações frequentes de beneficiários dos planos.
Segundo a advogada Marina Basile, especialista em Direito à Saúde, boa parte dos 12 mil clientes já atendidos por ela corresponde a beneficiários de planos, que também têm recorrido à judicialização para discutir carências e danos morais em razão de abusividades cometidas; para a manutenção dos convênios coletivos em casos de demissão e aposentadoria; pela negativa de cobertura de internação em hospital de referência; e para a realização de cirurgias altamente especializadas (como é o caso das cirurgias robóticas). “Outra demanda que só cresce vem da família de pessoas com Transtorno do Espectro Autista e de pessoas com alguma deficiência, que buscam garantir a cobertura de tratamentos multidisciplinares, tais como Método ABA; Terapia Ocupacional e Fonoaudiologia com Integração Sensorial, Neuropsicologia, Equoterapia, Psicopedagogia e Natação Funcional, dentre outros”, relatou.
Ainda segundo a consultora jurídica, usuários de planos têm acionado a justiça também pela necessidade de fornecimento de medicamentos imprescindíveis de alto custo para o tratamento de doenças graves, tais como Câncer, Hepatite, Doença de Crohn e Esquizofrenia; para cobertura de quimioterapia, radioterapia e exames avançados de imagens; para liberação de imunoterapia e hormonioterapia para tratamento de câncer; e para fornecimento de medicamentos para uso domiciliar. “Há casos urgentes em que precisamos entrar com pedido de liminar. É o caso, por exemplo, de negativas de internação urgente em Unidades e Centros de Terapia Intensiva (UTI e CTI) e de negativas de cirurgias fetais”, destacou Marina Basile.
Para a advogada, que acumula 20 anos de experiência em ações dessa natureza, “o mais importante é entender a dor que sofre o consumidor para, a partir daí, encontrar a melhor solução jurídica. Sem dúvida, a informação especializada, adequada e precisa, nesse momento, faz toda a diferença na efetiva busca pelo restabelecimento dos direitos violados pelo plano de saúde”, completou.
Recentemente, Marina Basile comentou a decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) pelo caráter taxativo do rol da ANS em detrimento do exemplificativo. Na opinião da especialista, os planos de saúde não podem se limitar a cobrir apenas aquilo que está previsto na lista da ANS, uma vez que ela serve apenas como exemplo para tratamentos básicos. Na prática, quando um paciente autista ou em tratamento oncológico, por exemplo, necessitar de um serviço de saúde que não está expressamente inserido no rol, será preciso procurar o Sistema Único de Saúde (SUS) ou, ainda, pagar de forma particular. Contudo, “sabemos que nem o SUS consegue atender a uma demanda tão grande nem os brasileiros estão ‘nadando em dinheiro’ a ponto de, além de pagar a mensalidade do plano de saúde, custear os procedimentos não contemplados no rol”, declarou.
O julgamento do STJ, comemorado pelas operadoras de saúde que se beneficiam da mudança, tem sido questionado por organizações da sociedade civil, coletivos, movimentos sociais e familiares de pacientes. O Superior Tribunal Federal (STF) e o Congresso Nacional ainda vão avaliar a pauta. “Estamos torcendo para que o entendimento de ambos seja diferente. Enquanto isso, seguimos oferecendo consultoria especializada aos pacientes que, de alguma forma, podem ser prejudicados pela decisão do STJ”, concluiu Marina Basile.
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